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    CAIXA DE PANDORA: BANDARRA E ARRUDA TINHAM RELAÇÕES “INAPROPRIADAS”

    Relatório da Corregedoria-Geral do Ministério Público do DF condena o hábito do procurador-geral de ter encontros com o ex-governador e seu vice fora do ambiente de trabalho

    Rudolfo Lago

    O ex-secretário de Assuntos Institucionais do Governo do Distrito Federal Durval Barbosa não parece ter qualquer dúvida do envolvimento do procurador-geral do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra, com o esquema de desvio de recursos públicos montado em Brasília pelo ex-governador José Roberto Arruda. Embora não tenha apresentado provas, é isso o que ele afirma em vários dos seus depoimentos. Sua certeza era tanta que, quando combinou com a promotora Alessandra Queiroga que faria a delação premiada detonando o esquema, Durval estabeleceu como condição que Bandarra não podia saber de nada.

    Ao investigar as denúncias de Durval, a corregedora-geral do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Lenir de Azevedo, diz não ter conseguido comprovar as acusações. Mas, ao final, conclui que elas possuem “indícios de veracidade”. O Congresso em Foco teve acesso à integra do relatório de Lenir e publica seus detalhes em três capítulos. No primeiro capítulo, apresentou o indício mais forte, de que Bandarra tenha participação no vazamento da Operação Megabyte (que tinha como principal alvo Durval Barbosa). No segundo capítulo, conta o início da aproximação entre Durval e a promotora Deborah Guerner, que seria, de acordo com o ex-secretário, uma espécie de intermediária de Bandarra.

    O terceiro capítulo mostra como se davam as relações entre Bandarra e Arruda. Ainda que não tenha comprovado se o procurador-geral tinha ou não envolvimento com o esquema, Lenir de Azevedo constata que Bandarra tinha o que ela chama de uma relação “não muito apropriada” com o ex-governador.

    Leia a íntegra do relatório da Corregedoria-Geral do MPDFT

    “Sobressai dos informes coligidos aos autos que o procurador-geral de Justiça, Leonardo Bandarra, costumava reunir-se, manter contato com o governador e seu vice fora das dependências oficiais e em diversos horários, o que não se apresenta muito apropriado, tendo em vista ser ele o chefe da instituição que atua como defensora da sociedade contra abusos e irregularidades cometidos por integrantes do governo do Distrito Federal”, escreve a corregedora.

    Uma das vezes em que Bandarra reuniu-se com Arruda e o vice Paulo Octávio fora do ambiente de trabalho foi justamente na casa de Deborah Guerner, a suposta intermediária entre ele e Durval Barbosa. A promotora Alessandra Queiroga foi testemunha do encontro. Seu depoimento, de certa forma, porém, atenua responsabilidades de Bandarra. Ela afirma que foi procurada por Bandarra, que lhe disse que Deborah, “insistentemente”, lhe pedia que aceitasse ter um encontro com o governador e com o vice na sua casa. Segundo Alessandra, Bandarra não queria ir ao encontro sozinho. Queria uma testemunha e, por isso, a chamou. A promotora conta que sua presença, inesperada, no encontro acabou por provocar uma certa “surpresa  e constrangimento”. Talvez por isso a conversa tomou um rumo protocolar que não justificava um encontro informal fora de ambiente de trabalho. Arruda disse que queria pautar seu governo “pelas orientações do Ministério Público”.

    Ele passou, então, a fazer perguntas sobre áreas suspeitas que herdou do governo Roriz: o Instituto Candango de Solidariedade, as obas da usina Corumbá IV, e os contratos da Codeplan, de responsabilidade de Durval Barbosa. Bandarra deu algumas informações, igualmente protocolares sobre o caso. Ao final, Arruda prometeu que faria um governo “probo”. Segundo Alessandra, Deborah e seu marido, Jorge Guerner, nada falaram durante a reunião. Mas, ao se despedir de Bandarra, Deborah lhe disse que a reunião havia sido “ótima”. Já com o carro em movimento, Bandarra comentou, então, com Alessandra, referindo-se a Deborah: “Ela está querendo um cargo no governo com a minha indicação”.

    Houve uma segunda conversa informal com Arruda na casa do próprio Bandarra, no final de 2008. Desta vez, a conversa girou em torno da presença de Durval no governo. Questionado sobre isso por Alessandra, Arruda explicou que Durval “havia lhe auxiliado durante a campanha e que seria muito difícil afastá-lo”. Na conversa, Alessandra menciona a história que circulava por Brasília de que Durval tinha vídeos comprometedores contra Arruda. “É tudo bobagem”, reagiu Arruda. Segundo a promotora, Bandarra praticamente nada falou durante a reunião. Ao final da conversa, Alessandra ficou convencida da existência dos vídeos, e passou a correr atrás deles. É nessa sequência que ela entra em contato com o jornalista Edson Sombra e, por seu intermédio, chega a Durval e propõe a ele a ideia da delação premiada.

    “Na banguela”

    As reuniões testemunhadas por Alessandra não são o único elemento a apontar para essa relação “não muito apropriada” entre Bandarra e Arruda. Em seu depoimento ao Ministério Público, Edson Sombra afirma ter presenciado um telefonema de Paulo Octávio pedindo um encontro com Bandarra, que aconteceu na casa do procurador.

    Durval afirma que em 2009 houve uma reunião dele com Arruda, os advogados Aristides Junqueira e Luciana Junqueira, o então secretário Alberto Fraga e o policial Dante Maciel, que assessorava Durval. Aristides Junqueira foi o procurador-geral da República responsável pela denúncia contra o ex-presidente Fernando Collor. Nessa reunião, comenta-se o envolvimento de Bandarra. Junqueira, segundo Durval, diz não acreditar que um procurador-geral, presidente do Conselho de Procuradores, pudesse “manchar a sua biografia” com coisas criminosas. “Não resista, porque quem paga sou eu, e, quando atrasa, ele cobra de mim pessoalmente”, respondeu Arruda, de acordo com a versão de Durval. Das pessoas presentes ao encontro, no entanto, o único que confirmou a versão foi Dante Maciel. Os advogados preferiram ficar calados.

    O que impressiona mais, no entanto, é um e-mail enviado por Deborah Guerner para Bandarra na rede interna do Ministério Público no dia 3 de dezembro de 2009. A Operação Caixa de Pandora já tinha acontecido, em 27 de novembro, e produzia seus efeitos. No e-mail, Deborah parece temer responder sozinha por irregularidades, e faz, nas palavras da corregedora Lenir de Azevedo, “conotações de ameaças” contra Bandarra. As palavras com letras maiúsculas foram assim destacadas por Deborah na mensagem:

    “Acredito, com certeza, que o SENHOR deve ter, POR ENGANO, colocado mal as palavras e, portanto, LHE PERGUNTO: o SENHOR está ACUSANDO (…), EU E MEU MARIDO, do que um delator premiado falou? Se for isso, parece que SEUS adversários estão começando a conseguir o que SEMPRE QUISERAM, me colocar CONTRA O SENHOR. Porque parece que, mais uma vez, VAI ME DEIXAR SOZINHA NA BANGUELA? Dessa vez, não vou ficar calada aguentando sozinha como IMPROBA para não macular sua HONRADA pessoa”.

    Lixo

    O que seria, conforme as acusações de Durval, a ponta do envolvimento de Bandarra e Deborah Guerner com o esquema de Arruda seriam contratos emergenciais feitos pelo governo na prestação de serviços de coleta de lixo. Os dois garantiriam, segundo acusa Durval, um abrandamento da apuração do Ministério Público nessa área. Nesse caso, o envolvimento seria mesmo anterior à gestão de Arruda. Além disso, haveria também um acerto na construção da sede do Ministério Público, pela construtora Paulo Octávio, do ex-vice-governador do DF.

    No caso dos contratos de coleta de lixo, o texto da Corregedoria menciona uma intervenção da então governadora Maria de Lourdes Abadia (ela substituiu Joaquim Roriz quando ele se desencompatibilizou para concorrer ao Senado). Numa reunião com o procurador-geral do MPDFT, Abadia apresentou uma proposta de Termo de Ajustamento de Contrato (TAC). Pela proposta, os serviços de coleta a manuseio do lixo seriam divididos entre cinco ou seis empresas. Uma das empresas era a WRJ Engenharia, que cuidaria do aterro sanitário. Segundo o promotor Ivaldo Lemos Júnior, isso chamou a atenção, porque aterro sanitário não era a área de atuação da WRJ. Mais tarde, Ivaldo disse, “por ouvir dizer”, que a proposta da TAC tinha sido elaborada pela própria Deborah Guerner. Finalmente, “por ouvir dizer”, ele ficou sabendo que o J em WRJ era Jorge Guerner, o marido de Deborah. Ivaldo afirma ainda que Deborah queria lhe prestar “assessoria” para a análise do setor de lixo.

    A corregedora-geral do MPDFT conclui que não há elementos que possam “concluir que o procurador-geral Leonardo Bandarra tenha de alguma forma influenciado na atuação” dos promotores que eram responsáveis pelos contratos na área de lixo. “As investigações necessitam, contudo, ser aprofundadas especialmente para confirmar a informação de que a promotora de Justiça Deborah Guerner tentou influir na proposta da TAC, oferecendo assessoria ao dr. Ivaldo para questões referentes ao lixo”, completa a corregedora-geral.

    Os “indícios de veracidade” das acusações de Durval Barbosa contra Bandarra e Deborah Guerner foram levantados pela Corregedoria-Geral do MPDFT. Caberá agora ao Conselho Nacional do Ministério Público dar encaminhamento à investigação.

    Outro lado

    Procurado pelo Congresso em Foco, o procurador-geral do Distrito Federal e Territórios, Leonardo Bandarra, disse, a partir da sua assessoria, que nada pode comentar sobre o relatório da Corregedoria porque não teve acesso a ele. Bandarra estranhou que a imprensa tenha tido acesso ao relatório, que é sigiloso. “Somente quando ele tomar conhecimento do inteiro teor do relatório é que poderá se pronunciar”, informou a assessoria.

    Sobre as denúncias de Durval, porém, de um modo geral, Bandarra se declara inocente. “Ele não sabe porque Durval resolveu falar essas coisas, mas desconfia que seja retaliação pelas várias ações que foram movidas contra ele pelo Ministério Público a partir do seu empenho e esforço pessoal”, diz a assessoria.

    Fonte: Congresso em Foco

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