Deu no Correio Braziliense: Presidenciáveis tentam se aproximar de segmentos religiosos
Ivan Iunes
Tiago Pariz
Embora atuem mais nos bastidores, as religiões com praticantes no país estendem o braço de forma diferente à atuação política. Especialistas apontam que várias delas contam com representantes diretos nos Três Poderes da República. Entre os partidos, há legendas como o PR e o PRB, com vínculo religioso claro. O PR reúne evangélicos de diversas correntes, como Assembleia de Deus e Igreja Batista. Já o PRB tem raízes na Igreja Universal do Reino de Deus. Por terem maior representatividade na população, os católicos apostólicos romanos e os evangélicos neopentecostais formam os setores mais disputados pelos políticos. No DF, as duas correntes têm quase o mesmo número de fiéis. “O que é mais importante em termos da disputa dos políticos em relação à agregação dos religiosos não é a garantia de votos em si, mas ser identificado como palanque mais adequado a cada crença, para não perder esse votos”, explica a professora da Universidade Federal Fluminense Christina Vital. A cientista aponta que dificilmente se ganha um voto somente pela religião, mas é fácil perder eleitores por causa dela.
Entre os presidenciáveis, a candidata que mais tem avançado sobre o segmento religioso, segundo avaliação de especialistas, é Dilma Rousseff. A petista já participou de eventos em rádios religiosas, missas e cultos evangélicos. Ao passo em que flerta com o chamado voto da fé, porém, Dilma tem tropeçado em contradições. Primeiro, esquivou-se de responder se Deus existe. Depois, disse não ter religião, mas respeitar quem é religioso. Até que decidiu assumir-se seguidora do Vaticano. “A questão religiosa influencia o voto, mas isso tem de estar em evidência. Tem de ter um valor e o eleitor tem de identificar isso”, explica o cientista político da Universidade de Brasília Ricardo Caldas. Até o momento, Dilma tem o voto declarado de partidos ligados às religiões neopentecostais, como o PR e o PRB.
Para fazer frente ao movimento de Dilma, o tucano José Serra vem reservando espaço cativo na agenda para eventos religiosos. Em Balneário Camboriú, rezou junto a evangélicos em abril. Na semana passada, iniciou o roteiro de cunho religioso “obrigatório”, por Juazeiro do Norte (CE) — o outro endereço é Aparecida do Norte (SP). Ontem foi a vez de participar, em Cachoeira Paulista (SP), da inauguração de um centro de apoio comunitário do grupo Canção Nova, um movimento da Igreja Católica carismática. Embora não tenha cometido contradição, analistas entendem que o pré-candidato ainda titubeia ao abraçar questões cruciais para a fé, como a questão do aborto e da união homoafetiva. “O Serra tem mais condições de reunir o voto religioso, que é tradicionalmente conservador, mas ele resiste a se enquadrar às teses desse grupo, como um político de centro-direita. Ele prefere a imagem de técnico, cientista e até centro-esquerda”, analisa Ricardo Caldas.
Agenda religiosa
Ainda que seja a única entre os presidenciáveis com currículo religioso, Marina Silva tem sido a pré-candidata com menor agenda ligada à religião. Depois de cogitar se tornar freira e se converter evangélica da Assembleia de Deus, Marina tem evitado os temas sensíveis às crenças. Na questão do aborto, diz que é pessoalmente contra, mas sugere um plebiscito para definir a legalização da prática. Em via oposta à própria crença, declarou que não iria se opor à união homoafetiva. A aposta no tom ambientalista, em detrimento do religioso, evitaria a perda dos votos dos jovens, hoje mais simpáticos à pré-candidata verde.
Para o presidente do PT, José Eduardo Dutra, a questão religiosa não deveria ser tratada como um divisor de águas nas campanhas, mas é fato que o eleitor entende esse tema como caro. “Não se pode fazer campanha pensando em agradar um ou outro grupo porque, naturalmente, se agradarmos muito um grupo , desagradamos o outro”, resume o petista. Um exemplo de passo em falso ao entrar na seara religiosa foi a derrota do então candidato à prefeitura de São Paulo Fernando Henrique Cardoso, em 1985. Durante um debate, o jornalista Boris Casoy perguntou ao ex-presidente se ele acreditava em Deus. Fernando Henrique preferiu tergiversar. Acabou derrotado na reta final.