Mudança de regra do Ministério de Minas e Energia deve elevar preço de geladeiras
Medidas protecionistas a favor de insumos como aço, polipropileno e compressores podem impactar na elevação do custo de produção. Além disso, mudança de regra provocada pelo Ministério de Minas e Energia pode elevar preço dos produtos afetando diretamente a população de baixa renda.
Prestes a encerrar o ano de 2023, o segmento de linha branca está prestes a registrar o segundo pior desempenho em vendas dos últimos 10 anos. A expectativa é de que o setor encerre o ano com a produção de 12,9 milhões de unidades de geladeiras, máquinas de lavar e fogões.
Esse resultado só não foi pior do que o registrado em 2022, quando as vendas não ultrapassaram a marca de 12,5 milhões de unidades. Esses volumes são significativamente inferiores aos observados em 2012 e 2013, anos que registraram, respectivamente, 20,4 e 18,3 milhões de unidades vendidas.
Os dados são fornecidos pela Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos, a Eletros, entidade que representa 98% da produção desses eletrodomésticos no país.
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Essa conclusão pode ser constatada ao observar a queda acentuada e progressiva nas vendas dos chamados ‘produtos de entrada’, ou seja, as geladeiras mais simples, de menor tamanho e com apenas uma porta, consequentemente, mais baratas. Essa realidade é explicitada ao analisar a participação dos consumidores das classes C, D e E nas vendas de geladeiras, que diminuiu nos últimos 10 anos de 36% para 11%. Isso é evidenciado no gráfico abaixo, onde também é possível notar uma tendência de queda geral no volume de vendas de refrigeradores ao longo do tempo, afetando até mesmo os modelos mais premium.
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Futuro incerto
De acordo com a Associação Nacional dos Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros), a indústria nacional tem se esforçado para manter a operacionalidade de suas empresas no país. Isso é feito por meio da revisão constante de processos, busca por insumos mais competitivos, investimento na modernização das instalações fabris, redução de desperdícios, aprimoramento dos canais de logística e até mesmo sacrifício das margens de lucro para enfrentar esse conjunto de fatores que resultam nos volumes mais baixos da década.
Este momento é considerado o mais desafiador na história desse segmento, e os fabricantes estão demonstrando preocupação com a falta de perspectivas de melhoria e a possibilidade de um cenário ainda pior.
“Estamos comprometidos com o desenvolvimento econômico do país, fortalecendo a indústria nacional e preservando empregos e investimentos. No entanto, estamos preocupados com a falta de perspectivas de melhoria no ambiente de negócios ou, o que é mais grave, a possibilidade de termos que lidar com potenciais aumentos nos custos de produção e redução de nossa competitividade devido a medidas destinadas a proteger determinados setores econômicos, assim como mudanças nas regras provocadas por alguns Ministérios”, afirma Jorge Nascimento, presidente executivo da Eletros.
Protecionismo representa risco de piora
Os fabricantes de eletrodomésticos, representados pela Eletros, identificaram um cenário com sérias ameaças de retrocesso para o mercado, especialmente para refrigeradores, fogões e lavadoras de roupas.
Com produtos que em média têm 50% de seus custos vinculados a materiais em aço, um aumento na alíquota de importação desse insumo, de 10,8% para 25%, como está sendo pleiteado pelo setor do aço, pode diminuir ainda mais a competitividade do mercado de insumos nacional. Isso colocaria a indústria nacional de manufatura em uma posição de dependência de um mercado que inibe a concorrência.
Um movimento semelhante está sendo observado entre os fabricantes de resinas plásticas, como o polipropileno, um insumo fundamental na fabricação de geladeiras e máquinas de lavar roupa, especialmente as semiautomáticas, como o tanquinho. Este material pode representar até 60% do custo do produto, que atende principalmente à população de menor renda.
“Os consumidores e, em certa medida, toda a sociedade acabam arcando com o custo da manutenção de protecionismos em alguns setores, visto que isso contribui para uma maior retração da economia, afetando diretamente as indústrias voltadas para transformação e inovação”, destaca Nascimento.
Compressores
De acordo com a Eletros, a proteção à indústria nacional de compressores, componente principal do sistema de resfriamento, é mais um ponto de preocupação para os fabricantes. A alta alíquota de importação desse insumo inibe a competitividade, já que os 18% aplicados pelo Brasil superam em muito a média mundial, que é de 5,1%.
Além disso, o imposto atual vai contra a lógica do escalonamento tributário ao aplicar uma alíquota maior no início da cadeia produtiva do insumo do que aquela aplicada no bem final (16%).
“Esse contrassenso parece indicar um certo privilégio dado pelo Poder Público aos fabricantes nacionais de compressores e aos importadores de geladeiras. Isso sugere uma possível desconsideração pela importância do setor eletroeletrônico instalado no país, responsável pela geração de mais de 200 mil empregos diretos e indiretos, além de representar 3% do PIB gerado pela indústria brasileira”, ressalta Nascimento.
Renato Alves, Diretor de Políticas Industriais de Linha Branca da Eletros, explica que, de acordo com levantamento dos fabricantes, a cada 1% de aumento no custo, há uma redução de 0,7 a 1% na demanda por geladeiras, fogões e lavadoras de roupas. “A indústria nacional tem feito todos os esforços necessários para oferecer produtos com preços acessíveis, pois os consumidores brasileiros não conseguem lidar com mais aumentos.
Medida do Governo Federal prejudicará população de baixa renda
O Comitê Gestor de Indicadores e Níveis de Eficiência Energética, presidido pelo Ministério de Minas e Energia, divulgou a Resolução nº 2, de 23 de novembro de 2023, introduzindo novos parâmetros de eficiência para geladeiras. Essa decisão vai de encontro às regras estabelecidas recentemente em conjunto com o setor produtivo, definindo metas de eficiência e um cronograma de execução tecnicamente inviáveis e incompatíveis com a realidade econômica do país.
Com essa determinação do Ministério de Minas e Energia, é previsto um possível aumento abrupto nos preços dos refrigeradores, especialmente os considerados de entrada, adquiridos principalmente pela população de renda mais baixa. Os impactos econômicos e sociais serão negativos para a indústria brasileira. Apesar de os objetivos estarem alinhados com os propósitos da indústria, que possui tecnologia para entregar produtos eficientes, os fabricantes defendem que a política deveria ter considerado o contexto socioeconômico nacional.
“Produzimos e oferecemos aos consumidores brasileiros produtos com altíssimo nível de eficiência energética, utilizando as tecnologias mais modernas. As indústrias estão ampliando a oferta desses modelos, tornando-os mais acessíveis. No entanto, quando há uma mudança nas regras impondo prazos curtos para atingir metas excessivamente rigorosas, isso resulta em aumento nos custos de produção com ajustes nos projetos dos produtos e aquisição de insumos mais sofisticados, tornando a geladeira mais cara e impactando imediatamente o bolso do consumidor. A retração no consumo e na economia do setor será notável com essa medida do Ministério de Minas e Energia”, destaca um representante da Eletros.
Os novos índices de eficiência eliminarão cerca de 83% dos refrigeradores atualmente vendidos no Brasil. A partir de agora, a comercialização predominante será de produtos considerados de alto padrão, custando em média de 4 a 6 vezes o salário mínimo nacional.
“É necessário considerar a realidade brasileira. Infelizmente, com as novas regras, o consumidor de baixa renda será o mais prejudicado e, consequentemente, a indústria e seus colaboradores. Desinvestimentos e perda de centenas de postos de trabalho podem ocorrer nos próximos meses. Apresentamos ao governo estudos técnicos mostrando este cenário ruim para a economia do país, porém, infelizmente, não foram considerados”, analisa Renato Alves, Diretor da Eletros.
Em 2021, o INMETRO, vinculado ao Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), estabeleceu um novo Programa Brasileiro de Etiquetagem para refrigeradores, com metas de eficiência energética a serem cumpridas em 10 anos. A partir de sua implementação em julho de 2021, os novos produtos devem ser até 30% mais econômicos na primeira fase e até 61% na última, a partir de 2030.
Antes mesmo da implementação do PBE, os fabricantes já ofereciam refrigeradores eficientes e sustentáveis, alinhados com os padrões mais altos estabelecidos pelo INMETRO. Gradualmente, a oferta de novos produtos com maiores padrões de eficiência vem aumentando à medida que os consumidores começam a migrar para esses produtos.
“As regras estabelecidas pelo Programa Brasileiro de Etiquetagem, pelo MDIC, em conjunto com o Inmetro, foram elaboradas em parceria com o setor produtivo e tiveram impactos econômicos, ambientais e sociais positivos, além de atrair investimentos para o país. Temos receio de que a decisão publicada pelo Ministério de Minas e Energia desfaça os planos baseados no PBE”, conclui Jorge Nascimento, representante da Eletros.
A Eletros buscará novamente o governo federal para ressaltar os prejuízos e os impactos econômicos, sociais e ambientais negativos das regras estabelecidas na Resolução nº 2 do CGIEE/MME, e espera que a medida seja revisada.