Enquanto o político mais corrupto da história do Distrito Federal sonha retornar à política, em artigo publicado no Metrópoles o Promotor de Justiça do Distrito Federal, Clayton Germano, que foi coordenador do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), do MPDFT, à época da Operação Caixa de Pandora, afirma que o ex-governador Arruda estará fora do páreo nas próximas eleições.
O ex-governador José Roberto Arruda está inelegível
Dr Clayton Germano*
As inúmeras ações de improbidade que lhe foram propostas versam, em regra, sobre contratos distintos, fatos específicos e pedidos diversos
A Lei Complementar nº 219/2025, ao alterar a Lei Complementar nº 64/1990, introduziu no seu art. 1º, por meio do §4-E, referência a “fatos ímprobos conexos” como hipótese apta a gerar inelegibilidade. Contudo, tais “fatos ímprobos” só podem produzir efeitos jurídicos eleitorais se houver, em termos processuais, a conexão entre as ações que os apuram — conceito que o Código de Processo Civil de 2015 disciplina no art. 55.
O art. 55 do CPC/2015 dispõe que reputam-se conexas duas ou mais ações quando lhes for comum o pedido ou a causa de pedir. A doutrina e a jurisprudência do STJ esclarecem que, quanto ao pedido, a conexão abrange tanto o pedido imediato quanto o mediato — não se exige identidade literal entre todas as pretensões, mas comunhão material do objeto ou do fim perseguido.
Analogamente, quanto à causa de pedir, a conexão deve fundar-se na causa remota e na causa próxima; isto é, partilhar fatos nucleares (causa remota) e fundamentos fáticos-jurídicos diretamente vinculados ao pedido (causa próxima). O STJ tem reiterado que a verificação da conexão admite essa amplitude, evitando decisões contraditórias.
Aplicando esses critérios ao caso do ex-governador José Roberto Arruda, verifica-se que as inúmeras ações de improbidade que lhe foram propostas versam, em regra, sobre contratos distintos, fatos específicos e pedidos diversos (ressarcimento, perda da função pública, suspensão de direitos políticos, etc).
Cada ação aponta causas de pedir próprias — fatos e fundamentos ad hoc ligados a um determinado instrumento contratual e atos administrativos diversos. Nessa hipótese não há, em cada uma das ações, comprovação de pedido comum (mediato e imediato) nem de causa de pedir comum (remota e próxima) que autorize tratá-las como “conexas” nos termos do art. 55 do CPC.
Por conseguinte, a interpretação restritiva e sistemática do §4-E da LC 64/90 (na redação trazida pela LC 219/2025) conduz à conclusão de que tal dispositivo não alcança automaticamente o ex-governador Arruda, por falta de efetiva conexão material entre ações específicas.
A aplicação da inelegibilidade por “fatos ímprobos conexos” exige prova da comunhão do pedido OU da causa de pedir; sem ela, não se justifica o alcance da nova hipótese de inelegibilidade.
*Clayton Germano é promotor de Justiça do DF. Ele foi coordenador do Grupo de Atuação Especial contra o Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), e atuou em operações como Caixa de Pandora e Drácon. Atualmente, é titular da Segunda Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (2ª Prosus).