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    “Vi que seria duro, não impossível”, diz Mara Gabrilli sobre voltar a se mover

    Por Milena Carvalho – iG São Paulo

    Deputada que hoje movimenta sua própria cadeira de rodas recorda acidente de carro que a deixou tetraplégica há 21 anos

    Deputada federal do PSDB é auxiliada por acompanhante durante ciclo de palestras na Câmara
    Lucio Bernardo Jr. / Câmara dos Deputados – 27.04.16

    Deputada federal do PSDB é auxiliada por acompanhante durante ciclo de palestras na Câmara

    Quando indagou ao médico sobre seu estado de saúde, Mara Gabrili já sabia que a situação era ruim. Mas, sem conseguir se mover após um acidente do qual somente ela saiu com graves ferimentos, ouviu como resposta que as chances de voltar a se mover existiam, sim, apesar de mínimas. E respirou aliviada: “Vi que seria duro, mas não impossível”.

    Foi voltando de Paraty, no litoral sul do Rio de Janeiro, para São Paulo, em 21 de agosto de 1994, que a hoje deputada federal do PSDB-SP viu sua vida sofrer a maior das reviravoltas. Ela, no banco do passageiro, o então namorado, dirigindo, e um amigo, no banco traseiro do carro, subiam a serra quando o motorista perdeu o controle do veículo em um local conhecido como “curva da morte”.

    Foram aproximadamente 15 metros de queda, marcada por diversos capotamentos. Mara, então com 26 anos, viu o airbag do banco de passageiro falhar. Com o impacto de cada virada do carro, seu corpo escorregou do cinto. O brutal acidente lhe quebrou o pescoço, a quarta e a quinta vértebras cervicais e lhe rendeu uma lesão medular da terceira à sexta vértebra. Foi assim que aquela que se tornou a principal representante das pessoas com deficiência no Congresso Nacional ficou tetraplégica.

    Vinte um anos depois do acidente, Mara relembra do episódio com bom humor. “Foi a pior dor física que já senti. Mas, mesmo com a cabeça doendo, lembro que fiquei toda torta para ver a lua, que estava muito bonita no dia”, recorda, aos risos, ao iG. Foram quase três horas de espera até a chegada do resgate. “A minha maior alegria foi ver o homem de laranja [do Corpo de Bombeiros] chegar.”

    Mara passou a noite em um hospital da região de Taubaté e, na manhã seguinte, foi levada de helicóptero a São Paulo. Três dias depois, foi submetida a uma cirurgia. “O médico resolveu esperar porque eu estava muito vulnerável. Se fizesse a operação logo, corria o risco de morrer. Mas se não fizesse, também corria.”

    Foi somente após duas semanas, quando retomou por inteiro a consciência, que a deputada resolveu perguntar o que, de fato, havia acontecido com ela. “Ninguém tinha me falado nada e todo mundo estava me olhando com aquela cara. Mas eu já estava ligada do tamanho da encrenca. A minha situação era terrível.”

    De repente, a realidade. O médico lhe contou que sua chance de voltar a se mover era de apenas 1%. “Se ele falasse que a possibilidade era zero, muita gente já desistiria ali mesmo. Eu vi que seria duro, mas não impossível”, lembra.

    Foram cinco meses de internação, três no Brasil e dois nos Estados Unidos. De volta ao País, na véspera de Natal, Mara se viu em um ambiente totalmente diferente. Devido à falta de acessibilidade na casa onde vivia, a parlamentar precisou se mudar para a residência de uma amiga, na Grande São Paulo, que já era adaptada. “Foi o pior dia da minha vida, eu me vi sem chão. Não estava mais na minha casa, o meu corpo era outro. Você perde as referências que tinha de antes.”

    O fato de não poder se mover também logo fez surgir percepções que Mara jamais imaginou existir. Praticante de esportes, amante da natureza, ela de repente descobriu que, para o bem de sua própria sanidade, precisaria aprender a lidar com as 24 horas do dia em que passaria completamente imóvel. “Quando você não se mexe, o tempo é completamente outro”, afirma.

    Com o tempo, conseguiu superar esse obstáculo. Aprendeu a conviver consigo mesma, descobriu coisas a seu respeito que até então desconhecia. Quando já havia começado a frequentar um centro de reabilitação, em 1997, a hoje deputada fundou o Instituto Mara Gabrilli, com o objetivo de ajudar a melhorar a qualidade de vida das pessoas com deficiência, cuja situação no Brasil é, nas suas palavras, “dramática”.

    Deputada Mara Gabrilli antes do acidente; ela perdeu os movimentos do pescoço para baixo
    Arquivo pessoal

    Deputada Mara Gabrilli antes do acidente; ela perdeu os movimentos do pescoço para baixo

    Com o trabalho da ONG ganhando força, Mara resolveu investir na política. Entre 2005 e 2007, foi escolhida titular da Secretaria Municipal da Pessoa com Deficiência e Mobilidade Reduzida de São Paulo. Na sequência, se candidatou a vereadora pela capital paulista e foi eleita com quase 80 mil votos, quinto melhor índice no pleito. Filiada ao PSDB, desde 2011 é deputada federal com foco principal na elaboração de propostas que aprimorem a qualidade de vida dos deficientes.

    Mesmo sem o movimento do pescoço para baixo, Mara garante não deixar de fazer o que quer, muito graças à ajuda da família, amigos e assessores. Para ela, o maior aprendizado com o acidente foi passar a planejar com antecedência tudo o que tem vontade. “Se quero testar alguma posição nova, até mesmo ficar de cabeça para baixo, eu penso qual músculo vou usar, quanto tempo vou levar para fazer… E tudo isso deu resultado”, exemplifica.

    Passados 21 anos, após inúmeras sessões de fisioterapia e uma vida completamente nova e inesperada, Mara percebe que fez bem em acreditar na probabilidade de 1% de recuperação dos movimentos que lhe foi dada pelo médico. Hoje, ela consegue pilotar sozinha sua própria cadeira de rodas.

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