Deu em O Globo
Dilma Rousseff: primeira entrevista coletiva após eleição
Chico de Gois e Luiza Damé
Na primeira entrevista coletiva após eleita presidente, Dilma Rousseff prometeu não enviar ao Congresso projeto de recriação da CPMF, tributo que servia para bancar parte dos gastos com a saúde e cuja continuidade foi rejeitada pelo Senado em 2007.
Dilma, que deu entrevista ao lado do presidente Lula, disse que prefere outros mecanismos à criação de impostos, mas adiantou que alguns governadores eleitos já a procuraram, demonstrando preocupação com o financiamento do setor e admitindo a possibilidade de criação de um tributo para ajudá-los no pagamento das despesas de saúde.
Dilma também reafirmou a intenção de negociar um aumento real para o mínimo (hoje em R$ 510) que vai vigorar a partir de janeiro.
Mas tanto ela quanto Lula rejeitaram a proposta de R$ 600, apresentada pelo tucano José Serra durante a campanha. Segundo ela, o piso salarial vai superar os R$ 600 na virada de 2011 para 2012.
A presidente eleita disse que ainda não discutiu a formação de seu governo. E condenou regimes ditatoriais, com a ressalva de que essa posição não pode prejudicar as relações comerciais do Brasil. Segundo ela, “business (negócios) são business”. Abaixo, os principais trechos da entrevista.
CPMF: “Tenho muita preocupação com a criação de imposto. Preferia que a gente tivesse outros mecanismos. Agora, tenho visto uma mobilização dos governadores nessa direção e não posso fingir que não vi.
(…) Está em questão a regulamentação da Emenda 29. Para a União, é mais fácil. Para os estados e municípios, é mais difícil. Então, é necessário com os governadores eleitos que se abra um debate.
(…) Eu não pretendo enviar ao Congresso a recomposição da CPMF.
(…) Do ponto de vista do governo federal, não há necessidade premente. Agora, do ponto de vista dos governadores, eu sei que há esse processo. Não posso ir além disto”.
Salário Mínimo: “Nós temos um critério que eu considero muito bom, que é o fato de nós darmos o reajuste baseado na inflação corrente e no PIB de dois anos anteriores. Temos o problema agora que é o fato de o PIB de 2009 é um PIB que se aproxima do zero.
Estamos avaliando se é possível fazer essa compensação (aumento real). Agora, eu adianto que num cenário de PIB crescendo a taxas que nós esperamos, o que nós vamos ter: um salário mínimo no horizonte de 2014 acima de R$ 700 e poucos.
Mantido o critério, já em 2011 ele estaria acima de R$ 600, no fim de 2011, começo de 2012. Nós vamos fazer esse ajuste”.
PMDB: “Eu tenho conversado muito com o vice-presidente Michel Temer e nós temos formado uma grande convicção: este é um governo que vai se pautar não por uma partilha, mas por um processo de construção de uma equipe una.
Quero reiterar: eu tenho visto por parte do PMDB iniciativa positiva e favorável a essa convicção. Eu quero aqui atestar: nunca o PMDB chegou para mim propondo e pedindo cargo. Estão participando do processo de transição como participaram de todo o processo eleitoral, sem conflito. Acho que a liderança do meu vice é muito importante para garantir que haja esse enfoque”.
Ministério: “Não quero anunciar fragmentado. Eu não sou doida de dizer para você que é dia 18 de qualquer mês, às tantas horas, porque, se eu anunciar uma hora depois, vocês vão falar assim: presidente eleita adia o seu lançamento por um hora.
Eu quero avisar para vocês que vou anunciar os nomes com muita tranquilidade. Vocês serão os primeiros a saber, até porque eu sei perfeitamente que eu dependo de vocês para que a população saiba”.
Nomes/Critérios: “Eu não estou falando agora sobre continuidade de nenhum ministério do ponto de vista de pessoas, estou falando do ponto de vista da continuidade das políticas. Não considero ainda que está maduro o processo de discussão a respeito dos nomes (…).
Agora, tenho critérios e externei isso no discurso: vou exigir competência técnica, vou exigir também um desempenho, um histórico de pessoas que não tenham problemas de nenhuma ordem, vou exigir também, eu acho importante, o critério político”.
DireitosHumanos 1 “Eu tenho uma posição bastante intransigente no que diz respeito aos direitos humanos, e essa posição intransigente se reflete no plano da diplomacia, como uma posição também de opção clara, porque uma manifestação que conduza à melhoria dos direitos humanos não necessariamente é estrondosa.
Muitas vezes, para você conseguir a melhora dos direitos humanos, você tem de negociar. Isso nós fizemos. Eu vi vários movimentos que foram benéficos. Eu quero dizer que no meu governo não vai haver nenhuma dúvida a respeito”.
Direitos Humanos 2 (Ao ser perguntada se o Brasil manterá vínculos comerciais com ditaduras): Business são business.
Reforma agrária/MST: “No que se refere ao MST, em todas as oportunidades eu sempre me neguei a tratar o MST como caso de polícia. O MST não é um caso de polícia.
No meu governo, não darei margem para Eldorado dos Carajás, porque isso também é uma questão de direitos humanos.
Agora, eu não compactuo com ilegalidade nem com invasão de prédios públicos nem com invasão de propriedades que estão sendo produtivamente administradas. Nós temos terras suficientes neste país para continuar fazendo reforma agrária (…)”.
Trem-Bala: “É um absurdo achar que o trem-bala não precisa ser feito. Nos anos 80, essa conversa vigorou para metrô. Diziam que o Brasil não poderia gastar em metrô porque metrô é caro e, além de ser caro, tem outra alternativa, como os corredores e transporte urbano sobre rodas. Com isso, somos um dos países que atrasou o investimento em metrô.
O trem-bala em um país continental, mas com grande densidade populacional no Sudeste e Sul, é absurdo as políticas que são obscurantistas e que consideram o trem-bala um absurdo. O investimento do trem-bala é feito pela iniciativa privada, e o financiamento a eles não concorre com o investimento em metrô e metrô só segura sendo público”.