Artigo: A relação dos consumidores com os planos de saúde é recheada de problemas. Quando mais precisamos, no momento da doença, a operadora de plano de saúde nos vira as costas e nos abandona. Quando da oferta do plano de saúde tudo são flores e promessas e nem poderia ser diferente, afinal querem nos cativar e nos convencer a formalizar o contrato. Depois, quando já estamos presos às empresas, a coisa muda de figura e parece que algumas operadoras enxergam em seus clientes verdadeiros inimigos.
Hoje, vou tratar de uma armadilha que está sendo muito difundida no mercado de planos de saúde, a modalidade de CO-PARTICIPAÇÃO, que é definida pela Agência Nacional de Saúde da seguinte forma:
É a parcela de pagamento, além da mensalidade, prevista em contrato e destinada a custear parte da realização de um determinado procedimento (Consulta, exame ou internação). A co-participação não pode corresponder ao pagamento integral do procedimento por parte do consumidor, nem ser tão alta a ponto de impedir o acesso do usuário ao tratamento necessário. No caso de internação, a co-participação não pode ser cobrada em forma de percentual, exceto nos tratamentos psiquiátricos.
Entendeu? Provavelmente não, como acontece com a maioria dos consumidores e com as pessoas que aderem a essa modalidade de plano de saúde.
Não entendeu por um motivo simples, essa é daquelas cláusulas que são mal redigidas com a nítida intenção de esconder o seu verdadeiro significado. A intenção do plano é de ludibriar o aderente ao contrato.
A publicidade de uma das empresas diz “no plano co-participativo, cada vez que você utiliza o serviço paga uma pequena parte”, e complementa, “por isso o plano fica com mensalidades menores e todos, usuário e operadora ganham”. Pura mentira, só o plano ganha e o usuário perde, não de forma imediata, mas no futuro. A co-participação é uma bomba de efeito retardado, vai estourar, só não sabemos quando e vai explodir prejudicando o cliente.
A ênfase dos corretores de seguro é a mensalidade menor e que você só pagará um pouco mais quando utilizar o plano. A disciplina dos planos de co-participação encontra-se no artigo 16, VII da Lei 9656/1998, assim redigido:
Art. 16. Dos contratos, regulamentos ou condições gerais dos planos e seguros tratados nesta Lei devem constar dispositivos que indiquem com clareza: […] VIII – a franquia, os limites financeiros ou o percentual de co-participação do consumidor, contratualmente previstos nas despesas com assistência médica, hospitalar e odontológica.
Ninguém menciona, no entanto, qual valor pode atingir a co-participação do usuário do plano de saúde. Qual a expressão financeira da co-participação? Antes de responder a indagação, quero trazer algumas hipóteses analisadas pelo Poder Judiciário em que o consumidor teve de arcar com a co-participação. Confira:
SEGUROS. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA CONTRATUAL. PLANO DE SAÚDE. Preliminares de ilegitimidade ativa e de nulidade da sentença. Rejeição. Cobertura de sessões de quimioterapia em tratamento ambulatorial. Possibilidade da cobrança da taxa de co-participação. Preliminares rejeitadas. Apelo provido. (Apelação Cível Nº 70014047385, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Pedro Luiz Rodrigues Bossle, Julgado em 28/06/2006.)
PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ANTECIPADA. PREVIDÊNCIA PRIVADA. Uma vez satisfeitos os requisitos da tutela antecipada, na forma do art. 273, do CPC, é de restar concedida. Situação em que o agravado buscou a cobertura de tratamento ambulatorial de quimioterapia, realizando transferência de plano de saúde para tanto e se propondo ao pagamento de `taxa de co-participação¿ prevista. Tudo, com suporte nos termos da Lei nº 9.656/98 e do art. 47 do CDC. Agravo desprovido. (Agravo de Instrumento Nº 70004912325, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Leo Lima, Julgado em 12/12/2002.)
Tratamentos de quimioterapia são caros. Não sei o valor exato, mas sei que são muito caros e que qualquer percentual aplicado sobre o custo de sessões de quimioterapias pode significar uma verdadeira fortuna para o usuário, mas ninguém informa tal fato quando da contratação de um plano de co-participação.
Vamos ver, agora, uma cláusula de co-participação retirada do contrato de adesão oferecido por uma operadora de plano de saúde brasileira, no que se refere a colocação de próteses e consultas:
SEÇÃO IV – Da participação do CONTRATANTE no valor dos serviços prestados ou reembolsados, conforme opção registrada no Anexo I
Art. 28º. Sobre o valor dos serviços de diagnósticos, prestados ou reembolsados, em caráter ambulatorial ou hospitalar, exceto nas emergências em pronto socorro, previstos nas alíneas ‘f’ ‘g’ do artigo 4º, e com base nas tabelas definidas no art. 25º, o CONTRATANTE participará dentro das seguintes faixas da TAMB/92:
Nº de CH na TAMB/92 Participação do Contratante
251 a 350 R$ 27,00
2351 a 2500 R$ 220,00
b) 25% do valor da consulta médica definida na alínea ‘o’ do art. 4º, para os inscritos no Plano Padrão Empresarial;
c) com o valores indicados na alínea ‘h’ do Art. 25º quando o período de internação exceder os primeiros 30 (trinta) dias, exceto durante a permanência em UTI;
d) 50% do valor da consulta médica definida na alínea ‘o’ do art. 4º, utilizadas na clínica psiquiátrica;
f) 50% do valor do chamado odontológico de urgência, em horário especial, com base na tabela da ABO (Associação Brasileira de Odontologia);
g) valor integral da consulta quando por vontade própria, procurar médico de sua livre escolha para a avaliação prevista no Art. 39º;
h) 50% do valor das sessões de fisioterapia subseqüentes as primeira vinte anual, com base na TAMB/92, conforme estabelecido na alínea ‘h’ do art. 4º.
Veja o item que prevê participação de 50% do chamado odontológico de urgência, em horário especial, com base na tabela da ABO. Agora imagine um acidente automobilístico com lesões múltiplas na arcada dentária e com a necessidade de diversos procedimentos odontológicos de emergência. Imagine que o acidente se dê na volta de um grito de carnaval ou de alguma festividade que ocorra em final de semana e no período da madrugada.
Não deixe de ver a cláusula referente às sessões de fisioterapia e de imagina como seria suportar 50% das sessões de fisioterapia, após extrapolar 20 sessões no ano, para alguém que tenha sofrido um Acidente Vascular Cerebral na passagem de ano e que precise se submeter a sessões diárias por quase todo o ano.
Não deixe de refletir no item C da cláusula contratual acima reproduzida, que se vale de uma redação indireta para esconder – com o valores indicados na alínea ‘h’ do Art. 25º quando o período de internação exceder os primeiros 30 (trinta) dias, exceto durante a permanência em UTI – o percentual sobre a internação.
Agora, penso que posso responder a indagação que formulei sobre o valor que pode alcançar a co-participação e a resposta é simples: PODE ATINGIR VALORES QUE O USUÁRIO NÃO PODE SUPORTAR.
Alguns tratamentos podem atingir valores astronômicos e aderir aos planos de co-participação pode redundar em grande prejuízo ao usuário, caso, de fato, ele necessite de procedimentos mais onerosos. As operadoras que oferecem tal modalidade de plano de saúde não explicam de forma adequada aos consumidores o alcance da regra, pois, se explicassem, muitos que já aderiram a essa espécie de plano de saúde teriam optado por um de cobertura integral, um pouco mais cara, mas que garantiria de forma mais adequadao tratamento médico hospitalar no momento da necessidade. FONTE: blogdoandredemourasoares.com.br