Pedido de vista adia julgamento da Ficha Limpa
STF planeja retomar votação na quinta-feira; relator votou a favor da aplicação da norma nesta eleição
Severino Motta, iG BrasíliaUm pedido de vista levou o Supremo Tribunal Federal (STF) a adiar o julgamento do recurso apresentado pelo ex-governador do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), cuja candidatura está sob risco de ser cassada com base na lei da Ficha Limpa. O pedido foi apresentado pelo ministro José Dias Toffoli, que prometeu trazer o caso de volta para a Corte nesta quinta-feira. Antes da interrupção o relator do caso, Ayres Britto, havia votado favoravelmente à aplicação da lei nas eleições de 2010.
O julgamento, apesar de pessoal, reflete sobre os demais casos de candidatos considerados ficha-suja pela Justiça Eleitoral. A resposta do Supremo para pode de uma só vez salvar todos os candidatos com ficha suja, ou complicar a situação daqueles que estão com processos na Justiça. Até agora, cerca de 250 candidaturas foram barradas com o uso da nova lei.
O pedido de vistas se deu após o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, discorrer sobre a constitucionalidade da nova lei. Segundo ele, alterações feitas pelo Senado no texto da lei aprovado pela Câmara – consideradas como de “redação” pelos parlamentares -, na verdade alteraram o conteúdo da norma. Como os deputados não reavaliaram o texto dos senadores, Peluso disse que a tramitação da matéria foi inconstitucional, o que poderia derrubar a lei da Ficha Limpa como um todo. “Não são emendas de mera redação. É um caso de arremedo de lei. Seria o caso de inconstitucionalidade formal”, disse.
No texto da Ficha Limpa aprovado pela Câmara constava a inelegibilidade para políticos “que tenham sido” condenados nos crimes ou ilícitos tipificados pela nova lei. No senado, o termo foi substituído por os “que forem” condenados e, alegando uma mera emenda de redação, a matéria não voltou para a Câmara e seguiu para a promulgação do Presidente da República.
O relator do recurso de Joaquim Roriz (PSC) no Supremo, Ayres Britto, foi contrário à tese de Peluso e disse que a Corte não pode, sem ter uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), derrubar a lei devido a falhas no processo legislativo. Ele chegou a dizer que Peluso, com sua argumentação, tenta dar um “salto triplo carpado hermenêutico”. O presidente da Corte, por sua vez, disse que quer a interpretação dos demais ministros sobre o caso.
Argumentos
Ao votar pela aplicação das novas regras, Ayres Britto já havia argumentado que a Constituição determina que a vida pregressa dos candidatos, no que diz respeito à probidade e moralidade, seja levada em conta na hora do registro de candidaturas. Sobre o caso específico do ex-governador – que renunciou ao mandato de senador para escapar de um processo de cassação e por isso foi considerado inelegível pela Justiça Eleitoral -, Ayres Britto disse que “quem abre mão do mandato de forma unilateral trai o cargo que ao assumir jurou cumprir com dignidade e devoção”.
Na primeira etapa do julgamento, que teve início às 14 horas, o procurador-geral eleitoral, Roberto Gurgel, também saiu em defesa da lei da Ficha Limpa e da manutenção da inelegibilidade Roriz (PSC). De acordo com ele, a lei não traz uma “pena” mas somente uma “condição” para as candidaturas.
Já a defesa do ex-governador do DF, representada pelo advogado Pedro Gordilio, disse que a lei é bem vinda para a democracia brasileira, mas só poderia ser aplicada nas próximas eleições. “Não estou aqui para questionar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade da lei, que é muito bem vinda. Mas cito o desrespeito ao artigo 16 da Constituição (…) A anualidade tem razão histórica, serve para impedir que fossem criadas hipóteses de inelegibilidade de forma casuística. Veio para sepultar malignos casuísmos da ditadura militar”, disse.
O julgamento de Roriz será determinante para candidaturas como as do deputado Paulo Maluf (PP-SP), o ex-senador Jader Barbalho (PMDB-PA) e os ex-governadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Marcelo Miranda (PMDB-TO) e Jackson Lago (PDT-MA). Todos têm processos em curso que esbarrariam na lei da Ficha Limpa.
Presenças
O STF, formado por 11 ministros, está com uma de suas cadeiras vazias desde a aposentadoria de Eros Grau. Por isso há possibilidade de um empate ser formado durante o julgamento do primeiro caso de Ficha Limpa pelo plenário da Corte. Caso isso aconteça os ministros terão de decidir se o voto do presidente, Cezar Peluso, vale como desempate para matérias em que a inconstitucionalidade de uma lei pode ser decretada. Caso a resposta seja negativa, o Supremo terá que aguardar a indicação de um novo ministro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ou convocar no Superior Tribunal de Justiça um magistrado para desempatar o placar.
Em tal hipótese há o risco do julgamento só acontecer depois das eleições, o que pode trazer confusão para o processo eleitoral. Sem definição sobre a Ficha Limpa, políticos com o registro de candidatura negado poderão disputar as eleições e ser eleitos num cenário de incertezas jurídicas.