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    Lei das Fake News viola os direitos constitucionais do cidadão

    *Paulo Goyaz

    Ao analisarmos o PL n. 2.630 de 2020 de autoria do ilustre Senador Alessandro Vieira (Cidadania/SE), denominado de “Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet” – Lei das Fakes News – que segundo sua explicação da Ementa “Estabelece normas relativas à transparência de redes sociais e de serviços de mensagens privadas, sobretudo no tocante à responsabilidade dos provedores pelo combate à desinformação e pelo aumento da transparência na internet, à transparência em relação a conteúdos patrocinados e à atuação do poder público, bem como estabelece sanções para o descumprimento da lei”, que foi aprovado pelo Senado Federal e agora tramita na Câmara Federal, neste momento pela relatoria do Dep. Orlando Silva, verificamos que seu texto viola princípios constitucionais básicos essenciais ao cidadão e ao Estado Democrático de Direito, dentre eles: o da livre expressão e a manifestação; livre desenvolvimento da personalidade individual; Legalidade; da Liberdade e da livre concorrência, dentre outros.
    Isto porque, na pratica o PL visa cercear a liberdade de manifestação, especialmente, de natureza política, ideológica, religiosa, do pensamento e da plena liberdade de manifestação, sem oferecer segurança jurídica ao cidadão, ampliando de forma injustiçada o poder do estado sobre os pensamentos de cada cidadão.

    A redação fixa o controle total das redes sociais, sobre o que pode e o que não pode ser publicado, violando assim a liberdade constitucional de expressão do pensamento, tão preconizada pelo Supremo Tribunal Federal em suas decisões até pouco tempo atrás.

    Na forma da redação, em primeiro lugar, inviabiliza os provedores existentes no País, pois estes ficarão expostos a demandas judiciais de natureza cível e penal, em face de entendimento, sem critérios legais do que seja ilícito e discurso de ódio, dentre outros, por exemplo.

    Os provedores – todos de natureza privada – que sobreviverem – caso algum sobreviva – terão a função do Estado de cercear a livre manifestação do pensamento, a ser realizado de forma plena e em especial sem qualquer critério. Haverá controle total sobre o que poderá ser ou não divulgado.

    Estes provedores, como dito, entidades privadas terão o direito sobre “o controle do que deve e do que não ser publicado”, “o poder de definir o que é ilícito ou abusivo”, dentre outras aberrações jurídicas, o que é extremamente perigoso, além de relegar o Poder Judiciário a mero coadjuvante.

    Cria a figura a figura jurídica da “ENTIDADE AUTONOMA DE SUPERVISÃO” – um verdadeiro “TRIBUNAL DE CENSURA” – com amplos poderes sobre as redes sociais, sem, no entanto, sequer definir o que seja esta entidade autônoma de supervisão e sua forma de composição e de funcionamento, que atuará em substituição ao Poder Judiciário.

    O que precisamos no momento não é um TRIBUNAL DE ÉTICA e o CONTROLE DO QUE PODE E DO QUE NÃO PODE, pelos Provedores e pelas entidades autônomas de supervisão, mas sim, um sistema legal que venha punir os eventuais excessos e os infratores.
    A nossa experiencia na Justiça Eleitoral nas três últimas eleições demonstraram que o sistema legal atual tem como combater, via poder judiciário, os excessos nas redes sociais, especialmente, pela via cível do ressarcimento de danos morais e materiais.

    A principal dificuldade é a identificação do usuário infrator – este responsável pela publicação – mas ai, a legislação pode e deve exigir que todo o perfil, tenha identificação em três níveis de segurança, que caberá a rede social adotar as cautelas de obter e facilitar o acesso, a saber:

    1 – DE FORMA ABERTA COM A CESSO A TODOS, em link específico da rede social, a identificação do perfil, com nome, cidade, Estado e foto do responsável pelo perfil.
    Com esta medida acaba com o anonimato – ou reduz drasticamente – e ao mesmo tempo permite aos demais usuários saber com quem está efetivamente se relacionando na rede social.

    2 – DE FORMA FECHADA, COM ACESSO AO INTERESSADO INDIFERENTEMENTE DE ORDEM JUDICIAL, MEDIANTE DEMONSTRAÇÃO DO DANO CAUSA, A SER FORNECIDO PELO PROVEDOR DA REDE SOCIAL, constando nome, endereço, CPF, cidade, Estado, e-mail e se possível whatsapp, para viabilizar a busca do poder judiciário pelo ofendido, como dados para agilizar a identificação do usuário infrator.

    Esta medida é uma relação entre um usuário e o provedor, em busca de identificar dados para busca do poder judiciário na defesa dos interesses do ofendido. O fornecimento exigirá a demonstração da ofensa.

    3 – DE FORMA FECHADA COM ACESSO APENAS COM COMANDO JUDICIAL, o acesso a todos os dados do usuário infrator e processado: nome, endereço, dados documentais, CPF, telefones, e-mails, IPs utilizados e rede de contatos dentre da rede social.

    Caso em que permitirá a investigação sobre o usuário de forma efetiva e garantida a eficácia das normas cíveis de reparação de danos.

    Tais medidas, simples, viabilizaram a punição efetiva de quem praticar ilícito na internet, com a garantia da responsabilização pessoal pelo ato praticado.

    Na área de punição, entendemos que o perfil salvo, o perfil em nome de terceiros e o perfil com documentos falsos devem ser apenados com multas pesadas, a fim de inibir a prática, além de tipificarmos como crime, em legislação própria para tal, pois estes não têm direitos.

    A partir do momento em que se assegura a liberdade de manifestação da rede social, pode se exigir que todos o usuário seja efetivamente identificado pelos demais participantes, pois se é um direito de participar há uma obrigação de identificação. (exemplo: todo cidadão pode frequentar as dependências do Congresso Nacional, mas para entrar precisa ser identificado. Quem não quiser ser identificado não pode entrar, sem que isto viole seus direitos).

    No mais, seria adequar a legislação civil para a punição severa aos excessos, aos ilícitos e as fakes News no campo cível e somente em casos muitos específicos no campo penal.

    Por fim, estamos num Estado Democrático de Direito, nos termos da nossa Constituição Federal e este pelas suas peculiaridades ”o Estado Democrático de Direito é aquele em que o poder do Estado é limitado pelos direitos dos cidadãos. Sua finalidade é coibir abusos do aparato estatal para com os indivíduos. Os direitos fundamentais conferem autonomia e liberdade aos indivíduos nas suas atividades cotidianas e limitam o poder do Estado sobre elas” e não como deseja o PL.

    As redes sociais, nos tempos atuais são os mecanismos máximos de expressão de todo o povo, indiferentemente, do seu poder econômico ou político, todo o cidadão tem o direito de se expressar, de tentar ser famoso e de emitir suas opiniões, devendo ser limitado apenas os abusos e este como acima demonstrados tem meios para evita-los, principalmente, na área cível assegurando direitos especiais aos ofendidos e punição financeira ao ofensores e acabando com o anonimato.

    A punição estatal penal contra o infrator terá pouca ou quase nenhuma eficácia no nosso atual sistema penal.

    No Estado Democrático de Direito, as leis são criadas por representantes da população e, por conseguinte, da vontade geral. Seu princípio básico é sintetizado por Abraham Lincoln na máxima: “governo do povo, pelo povo e para o povo”.

    O Estado Democrático de Direito vai além da democracia representativa de escolha periódica dos governantes, ele requer a participação popular efetiva e constante nas decisões políticas, de modo a conduzi-las a fim promoverem justiça social. Portanto, os valores de liberdade política e de igualdade política, nesse regime, devem caminhar juntos.

    Outros vetores inibidores do poder estatal são a separação dos poderes em Executivo, Legislativo, Judiciário e a democracia política. Nesse modelo de Estado, a soberania popular é que dá a legitimação para os legisladores criarem o corpo de leis, a Constituição, que norteará as ações de cidadãos comuns e de agentes estatais. No Brasil, o Estado Democrático de Direito está preconizado no Artigo 1º da Constituição de 1988, balizado pela premissa de que todo poder emana do povo.

    O Estado Democrático de Direito caracteriza-se pela soberania popular e não pelo controle social pelo Estado, por uma Constituição elaborada em conformidade com a vontade popular, por eleições livres e periódicas, por um sistema de garantias dos direitos humanos, e pela divisão de poderes independentes, harmônicos entre si e fiscalizados mutuamente, a saber: Executivo, Legislativo e Judiciário.

    O Estado é necessário para manter a organização político-administrativa que lida com as relações de ordem social e produtiva sobre seu território, detendo o monopólio do uso da força e o monopólio fiscal, além de ser através do Poder Judiciário, responsável pela mediação dos conflitos entre indivíduos.

    O Estado existe para proteger os cidadãos e não para controlá-los, como quer o PL em análise, que nada mais quer do que criar o absolutismo do Estado sobre o cidadão.
    O Estado de Direito preconiza os direitos e liberdades fundamentais do indivíduo. Sua característica básica consiste em que o exercício do poder pelo Estado seja limitado por um ordenamento jurídico e como dito, não ao contrário.

    Opinamos pela rejeição do projeto como um todo, pois pequenas alterações não modificaram a situação jurídica que ali se pretende estabelecer contra os cidadãos e as empresas de provedores e de redes sociais em geral.

    Sugerimos a regulamentação sobre a identificação do usuário pelo provedor, melhorar o sistema cível de reparação de danos e caso aprovado poderemos fazer estudos neste sentido.

    Paulo Goyaz é Advogado, articulista e conferencista

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