Entrevista/Márcio Thomaz Bastos |
“A oposição apostou e perdeu” |
Hugo Marques, revista IstoÉ Quando ocupava o Ministério da Justiça, o advogado Márcio Thomaz Bastos tornou-se um dos principais conselheiros do presidente Lula. Hoje, além de manter sua influência na cúpula do governo, conversa com os principais coordenadores da campanha da ministra Dilma Rousseff (PT). É, portanto, um interlocutor privilegiado do poder. E, se depender da opinião do ex-ministro, a aplicação da lei dos fichas limpas não passará pelo crivo do STF. “Em minha opinião, a lei não pode retroagir, o texto é inconstitucional”, diz Thomaz Bastos. Em entrevista à ISTOÉ, ele compara a atual eleição à de 1994, quando a oposição se beneficiou do Plano Real. A diferença, diz, é que agora os papéis estão invertidos e os principais atores são o presidente Lula e a candidata Dilma. “O governo do presidente Lula teve um foco, que era a distribuição de renda, diminuir a desigualdade brutal que ainda existe no Brasil. Foi bem sucedido nesse sentido”, ressalta Thomaz Bastos. Ele discorda do ex-deputado José Dirceu, para quem o PT terá mais poder no governo Dilma do que no governo Lula. “Não acredito que opartido tomará conta do governo”. Márcio Thomaz Bastos – A lei tem uma origem excelente, que é a iniciativa popular. E tem uma finalidade ótima. Mas, em minha opinião, o texto é inconstitucional. Fere a presunção de inocência. Antecipa a eficácia da punição antes que ela transite em julgado. Márcio Thomaz Bastos – É a mesma opinião minha. A lei limita a soberania da escolha popular, você tira o direito do eleitor de escolher ou não escolher. Em minha opinião, a lei esvazia a competência dos tribunais superiores. Por uma decisão de colegiado de segundo grau, às vezes você afasta os tribunais superiores do controle de constitucionalidade e de legalidade que eles devem fazer sobre as decisões. Márcio Thomaz Bastos – Acho que não, porque o importante é preservar as cláusulas pétreas da Constituição. E a presunção de inocência talvez seja a mais pétrea dessas cláusulas. Não é injusto um ficha-suja ser eleito? Márcio Thomaz Bastos – Estamos num estado de Direito republicano.Vale o império da lei e não o dos homens.
Márcio Thomaz Bastos – Acho que sim. Ele é um homem que tem toda uma história toda de vida, uma história de serviços à advocacia e à magistratura, fez uma gestão à frente do STJ importantíssima, promoveu a digitalização e a informatização daquilo tudo, então acredito que ele é um nome importante e que será considerado pelo Presidente da República. As multas de R$ 5 mil para os candidatos não são um incentivo ao desrespei to à lei eleitoral? Márcio Thomaz Bastos – A lei eleitoral brasileira está na contramão, está atrasada em relação aos fatos. O período chamado pré-campanha está totalmente O Tiririca desmoraliza a política brasileira? Márcio Thomaz Bastos – Eu acho que não é bom para a política brasileira uma campanha com esse teor destrutivo embaixo de uma camada de humor. Mas, por outro lado, a liberdade do eleitor é importante. Que o eleitor vote. É preferível votar no Tiririca do que não poder votar em ninguém. Como o sr. vê a declaração do presidente Lula, sugerindo “extirpar” o DEM da política brasileira? Márcio Thomaz Bastos – É uma figura de linguagem de quem fala em comícios. E um pouco a retorsão (réplica) daquilo que o senador Jorge Bornhausen falou lá atrás de “acabar com essa raça”. O senador Bornhausen havia sido mais duro? Márcio Thomaz Bastos – São duas figuras importantes na vida pública. Ambos,em minha opinião, usaram de figuras de linguagem um pouco em temperatura alta. É natural que nessa atmosfera aquecida eleitoralmente as pessoas usem expressões mais quentes. O sr. ainda dá conselhos ao presidente Lula? Márcio Thomaz Bastos – Nunca dei conselhos. Agora, eventualmente, tenho diálogos com ele. Troco idéias. Com essa correria, tenho tido pouco tempo para conversarmos Márcio Thomaz Bastos – Eu converso muito com ela, converso muito com os coordenadores da campanha. Sou amigo deles, sou ligado a eles, estou engajado na campanha, trabalho nessa eleição dessa maneira. Márcio Thomaz Bastos – Acho que ela pode fazer um grande governo. Ela é uma gestora treinada, é uma mulher amadurecida, se preparou muito para isso e já vem há cinco anos e meio exercendo uma coordenação geral do governo, de modo que ela já conhece os projetos, conhece as linhas, é capaz de fazer os ajustes, as correções de rota que parecerem necessárias. Acho que ela pode fazer um grande governo. Márcio Thomaz Bastos – Ele é um quadro da mais alta qualidade do partido e dentro da Nação brasileira. O Palocci é um sujeito transcende o Partido dos Trabalhadores. Ele é um homem que conversa com todas as áreas e que tem o respeito de todas as áreas. E como ele está muito próximo dessa campanha, ele é o coordenador geral dela, eu imagino que ele terá um cargo de destaque assim: ministro da Fazenda, chefe da Casa Civil, ministro da Educação. Ele terá um papel muito importante no governo da Dilma. Márcio Thomaz Bastos – Estamos disputando uma eleição muito semelhante à de 1994, que tinha um fator decisivo, que era o bem estar do país com o Plano Real. Tudo dava errado para a oposição. Acho que agora esse fator decisivo é o bem estar da população. Todo mundo comprando, ganhando dinheiro, adquirindo cimento tijolo, carro, utensílios. Há emprego e luz elétrica e o governo do presidente Lula fica marcado na história do Brasil. As pessoas querem que o governo continue. O sr. está ajudando na defesa da ministra Erenice Guerra? Márcio Thomaz Bastos – Eu conversei com ela. Indiquei a ela um escritório de advocacia, com quem ela está conversando. O que a ministra Erenice Guerra lhe disse? Márcio Thomaz Bastos – Conversei ligeiramente com ela. Ela está muito consciente que não cometeu nenhum tipo de crime. Abriu o sigilo dela inteiro. A reação do governo tem se mostrado nervosa. Como Erenice está enfrenta ndo essa crise? Márcio Thomaz Bastos – É. Dá um estresse, não é? Dá um estresse, mas ela está muito bem, ela está muito consciente. Estive com ela aproximadamente meia hora, na segunda-feira, antes do almoço. Márcio Thomaz Bastos – Acredito que o PT continuará no governo, continuará dando suporte à ministra Dilma, ela presidente, da mesma maneira que deu suporte ao presidente Lula. Não significa que o partido avassalará, que tomará conta do governo. Márcio Thomaz Bastos – Não sei se aparelham o Estado. Acho que todo partido que vai para o poder leva os seus quadros. Isso é uma coisa. Você pode dar a isso o apelido de aparelhamento. Você governa com quem está com você. Para isso que existem os partidos políticos. Márcio Thomaz Bastos – Nem pensar. A economia aqui é muito madura. E o presidente Lula deu uma demonstração do seu amor à democracia e à própria biografia ao ter recusado o terceiro mandato. Com o nível de aprovação que tinha, para ele seria extremamente fácil conseguir a aprovação do terceiro mandato, numa emenda constitucional, à semelhança do que o presidente Fernando Henrique fez. O presidente Lula poderia ter feito isso, ou pelo menos ter feito essa tentativa. E uma tentativa que, com uma aprovação de quase 80%, seguramente, ou muito provavelmente, seria muito bem sucedida. Ele poderia ter conquistado outro mandato? Márcio Thomaz Bastos – Por que ele não fez isso? Por que ele não gosta do governo? Não. Todo mundo vê que ele gosta de governar. Parece que ele nasceu para cumprir esse papel. Ele não fez isso pelo respeito que ele tem pela democracia e pelas próprias instituições democráticas. Márcio Thomaz Bastos – A oposição tem que ser repensada. A oposição talvez não tenha cumprido seu papel e, por outro lado, foi surpreendida pela qualidade do governo do presidente Lula, que se manifestou exuberantemente no segundo mandato. Ela apostou e perdeu, faz parte do jogo democrático. Por que o PT não mostra em São Paulo a mesma força que tem outros Estados? Márcio Thomaz Bastos – Essa é uma boa pergunta. Eu não sei responder. São Paulo sempre teve uma tradição de governos mais conservadores. Adhemar de Barros, Jânio Quadros, Maluf. De repente, esse eleitorado foi absorvido pelo PSDB, pelos tucanos. Esse eleitorado não vota no PT. Em 1988 havia uma dicotomia entre PT e Maluf, depois houve disputa entre Marta e Maluf. E depois o PSDB tomou esse lugar à direita. |