Deu no Correio Braziliense: Detran está à beira de um colapso
Empresas citadas em escândalo político têm pagamento suspenso e paralisam alguns serviços, como a emissão de boletos e documentos, em Brazlândia. Na semana que vem, outros postos estarão na mesma situação. Até a vistoria ficará comprometida
Adriana Bernardes
Ary Filgueira
Unidade do Detran no SIA só tem material para trabalhar até terça-feira |
Na prática, o cidadão não conseguirá obter junto ao órgão documentos de porte obrigatório, como a Carteira Nacional de Habilitação (CNH), o Certificado de Registro e Licenciamento de Veículos (CRLV) ou o Certificado de Registro de Veículo (CRV ou DUT). Até mesmo a vistoria ficará comprometida porque o Detran não terá como emitir o laudo nem o boleto para o pagamento das taxas.
A paralisia no atendimento ao público tem relação direta com o escândalo da Caixa de Pandora. Três empresas que mantêm contrato com o órgão — a Search Tecnologia, a Call Center, responsável pelo atendimento do telefone 154, e a Unirepro — tiveram os pagamentos suspensos por terem sido citadas no Inquérito nº 650 do Superior Tribunal de Justiça (leia Memória). Segundo denúncias do ex-secretário de Relações Institucionais Durval Barbosa à Polícia Federal, essas empresas se somam a outras 16 que, supostamente, mantinham esquema de pagamento de propinas a integrantes do governo em troca dos contratos milionários.
Dono de uma agência de carros, Massuh já prevê os transtornos |
A decisão de interromper o pagamento foi tomada pelo então governador interino Wilson Lima (PR). Assim que assumiu o Executivo, em fevereiro, ele publicou um decreto proibindo o repasse de dinheiro a todas as empresas citadas no escândalo. Por isso, apesar de ter recursos em caixa, o Detran não pode quitar a dívida de R$ 7,8 milhões com a Search. Também não pode acertar as contas com a Unirepro (R$ 40 mil) e nem com a Call Center (R$ 820 mil), responsável pelo serviço 154. Por meio da assessoria de imprensa, o Detran reconheceu as dificuldades, mas informou que o diretor-geral, Geraldo Nugoli, não comentaria o assunto.
Preocupação
O contrato com a Unirepro venceu e nenhuma empresa foi contratada para prestar o serviço de reprografia (xerox de documentos). A Call Center já comunicou ao órgão que, a qualquer momento, vai interromper os serviços. Mas o que mais causa preocupação é o contrato com a Search. A empresa fornece não apenas cartuchos e toner para impressora, como também todos os programas de informática que permitem ao Detran consultar os bancos de dados nacionais. Caso a empresa interrompa os serviços, o Detran não tem como checar as pendências de motoristas e veículos no sistema nacional.
Rogério Gonçalves também teme prejuízo para a sua clientela |
Memória
Decreto cessa pagamentos
No primeiro dia à frente do governo, o deputado Wilson Lima (PR) publicou um decreto suspendendo o pagamento de todos os contratos do GDF com as empresas citadas no inquérito da Operação Caixa de Pandora. A investigação conduzida pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) apura um suposto esquema de arrecadação e distribuição de propina envolvendo o Executivo e o Legislativo locais, além de empresários da cidade. O decreto atingia 13 empresas, entre elas a Search, Unirepro e Call Center, que mantinham contrato com o Detran. Os pagamentos só seriam liberados após o Tribunal de Contas do DF apresentar o resultado das auditorias. Se for comprovado que não houve irregularidades na execução dos contratos, as empresas poderão receber o dinheiro público novamente. No fim do ano passado, os distritais aprovaram o orçamento de 2010 com cerca de R$ 505 milhões que seriam destinados ao pagamento das firmas sob suspeição.
A previsão
Unidade – Situação de atendimento
Brazlândia – desde sexta, não emite qualquer documento
SIA – até terça-feira
Gama/Sobradinho – até quarta-feira
Taguatinga – até sexta-feira
Prejuízo a milhares
Diariamente 5 mil pessoas solicitam algum tipo de serviço ao Detran, pessoalmente ou por meio da internet, segundo a Search. O assessor jurídico da empresa, Renato Muniz, informou que, após cinco meses sem receber, ficou impossível manter os serviços. “Seguramos esse tempo todo à espera de uma solução, mas chegou a um ponto que não temos como bancar os serviços com nossos próprios recursos”, lamentou.
A interrupção do atendimento ao público causará transtornos aos proprietários de agências e concessionárias de carros no Distrito Federal. Eles foram pegos de surpresa com a notícia de que o Detran já não consegue emitir documentos no posto de Brazlândia e que a crise se estenderá às outras unidades. Gerente da Suprema Effa Veículos, Rogério Gonçalves espera emplacar 10 carros na segunda-feira. “O prejuízo será o desgaste com o cliente, pois ele não poderá rodar com o carro sem o protocolo que substitui o documento por 30 dias, que é o tempo em que este fica pronto”, lamentou.
A Cidade do Automóvel tem aproximadamente 300 lojas de vendas de veículos — entre agências e concessionárias. Por dia, cada uma chega a comercializar, ao menos, dois carros. Proprietário da agência Massuh Automóveis, Nakle Massuh, 43 anos, teme as multas que poderão ser aplicadas em veículos que não forem transferidos no prazo. “Temos alguns carros com DUT assinado. Quero saber se o Detran vai perdoar a multa, que é de R$ 127, caso esses problemas todos venham a acontecer”. O Correio procurou a Call Center e a Unirepro, mas não obteve retorno até o fechamento desta edição.