Deu na Folha de S. Paulo
Caso Erenice – Filho acusado de cobrar comissão
Firma de lobby de filhos da ministra foi procurada para viabilizar projeto de energia solar. Negociação custaria 5% do empéstimo e R$240mil em 6 vezes, dizem empresários
Rubens Valente, Fernando Odilla e Andreza Matais
Uma empresa de Campinas confirma que um lobby opera dentro da Casa Civil da Presidência da República e acusa filho da ministra Erenice Guerra de cobrar dinheiro para obter liberação de empréstimo no BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Interessada em instalar uma central de energia solar no Nordeste, a EDRB do Brasil Ltda. diz que o projeto estava parado desde 2002 na burocracia federal até que, no ano passado, seus donos foram orientados por um servidor da Casa Civil a procurar a Capital Consultoria.
Trata-se da firma aberta em nome de um dos filhos de Erenice, Saulo, e que foi usada por outro, Israel, para ajudar uma empresa do setor aéreo a fechar contrato com os Correios – primeiro negócio a lançar suspeitas de tráfico de influências no ministério.
Graças à mediação da Capital, representantes da EDRB disseram em entrevistas gravadas à Folha ter sido recebidos em audiência oficial por Erenice na Casa Civil, em novembro, quando ela exercia o cargo de secretária-executiva e a titular do ministério era a hoje candidata à Presidência Dilma Rousseff (PT).
Nos dois meses seguintes, por meio de reuniões em Brasília, com a participação de Israel Guerra, telefonemas e e-mails, a EDRB afirma ter sido informada das condições impostas pela Capital para que um financiamento de R$ 9 bilhões do BNDES, em três parcelas, enfim saísse.
Os termos, segundo a empresa de Campinas, incluíam seis pagamentos mensais à Capital de R$ 40 mil e uma comissão de 5% sobre o valor do empréstimo. Segundo o relato, haveria também um repasse de R$ 5milhões para supostamente ajudar a campanha da eleição de Dilma.
“Não aceitamos pagar nada. Temos investidores, empresas que querem construir, gerar alguma coisa, e não criar vagabundos dessa forma”, disse à Folha Rubnei Quícoli, consultor da EDRB que fez os contatos com a Casa Civil e com a Capital.
“Nos foi apresentada uma minuta de contrato. A gente contrataria uma empresa para fazer o acompanhamento jurídico do negócio todo. A empresa do filho da dona Erenice. Olhei os valores e disse: ‘Bom, para fazer acompanhamento jurídico desse troço, a gente não concorda pagar isso’. E aí o negócio terminou”, confirmou Aldo Wagner, sócio da EDRB.
Quícoli, 49, encaminhou à Folha documentos e cópias de e-mails que, segundo ele, corroboram as afirmações.
Uma das mensagens, de 15 de dezembro e endereçada aos donos da EDRB (Aldo e Marcelo Escarlassara), traz a minuta encaminhada pela Capital, que indica como seu procurador o empresário Adriano da Silva Costa.
O contrato pede pagamento de R$ 240mil em seis prestações mensais e uma “comissão de sucesso” de 5% sobre o empréstimo, o equivalente a R$ 450 milhões.
O acordo tem estrutura e redação similares ao que a Capital havia encaminhado para intermediar a renovação de contrato da empresa aérea MTA com os Correios.
A Folha obteve também a troca de e-mails entre a Casa Civil e o consultor da EDRB, com vistas a marcar a audiência oficial com Erenice. O encontro ocorreu às 17h de 10 de novembro no CCBB (Centro Cultural do Banco do Brasil), em Brasília, que na época era a sede da Presidência.
A Casa Civil confirmou a reunião ontem, mas informou que Erenice não participou. Quícoli e Aldo Wagner sustentam, no entanto, que ela participou.
Dizem que ela não intercedeu em favor do filho nem pediu dinheiro. Segundo eles, ela ouviu sobre o projeto e se propôs a fazer a ponte entre a EDRB e a Chesf (Companhia Hidroelétrica do São Francisco), estatal geradora de energia.
“Nesse dia, ela [Erenice] propôs o quê? Viabilizar o projeto dentro da Chesf. […] Estivemos na Chesf, em São Paulo”, disse.
Segundo o consultor, o encontro com Erenice foi agendado por Vinícius Castro, que era assessor da Casa Civil até segunda-feira. Foi exonerado depois que a “Veja” revelou que seria sócio oculto de Israel na Capital.
Assinante do jornal leia mais em Empresa acusa filho de Erenice de cobrar comissão para liberar crédito no BNDES
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O consultor Rubnei Quícoli, representante da empresa que tentava obter o financiamento no BNDES por meio da empresa de lobby Capital, foi condenado em processos movidos pela Justiça de São Paulo sob duas acusações: receptação e coação.
Quícoli recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo e, em março deste ano, foi absolvido do delito de coação. A Justiça substituiu a pena de um ano de reclusão por receptação por prestação de serviços comunitários.
Quícoli foi denunciado, em maio de 2003, por ocultar “em proveito próprio e alheio” uma carga de 10 toneladas de condimentos, que “sabia ser produto de crime de roubo”.
Em 2000, após denúncia anônima, o consultor foi acusado de receptação de moeda falsa num posto de gasolina em Campinas.
A polícia apreendeu no posto sete notas de R$ 50,00. Quícoli afirmou não saber a procedência.
Em 2007, Quícoli foi preso e passou cerca de dez meses na prisão.
Os donos da EDRB, Aldo Wagner e Carlos Marcelo Mello Escarlassara, não têm passagens pela polícia nem condenações.